Sejam todes muito bem vindos ao Conchas, este restaurante imaginário no fim da galáxia! Abrindo hoje excepcionalmente por conta desta data comercial que promete alavancar a receita dos restaurantes. E, porque, sempre é bom ter um motivo para falar de amor.
Reencontrei esses dias a mãe de uma amiga de infância, cujo filho caçula, moço feito e muito bonito, estava passando por grandes mudanças.
Ela veio me contar uma novidade, muito na boca miúda, à título de fofoca familiar a qual ganhei acesso pelos anos de convivência. É que esse filho, adolescente, tinha começado a namorar. E, ao fim de um mês - que equivale a um ano quando se é menor de idade - passou a chamar a escolhida de meu chuchuzinho.
– Mariana, eu tive que intervir, ela disse, e eu esperei, apreensiva.
Que mal existe em namorar, pensei, trocar ursinhos de pelúcia, chocolate ruim com gordura que gruda na boca, fazer juras de eternidade( os jovens ainda fazem essas coisas?).
Nunca tinha pensado nela como uma mãe ciumenta. Bom, quem sabe, a moça não era simpática, ou talvez tivesse cometido alguma gafe.
Ela continuou, dizendo que as palavras tem poder e que não ia deixar o filho seguir chamando ela do fatídico legume sem graça. O motivo?
– Ele o-de-i-a chuchu! Desde pequenininho. Não come por nada desse mundo.
Aaaaaaah.
O amor e suas linguagens. E o chuchu, essa famigerada hortaliça, prima da tanto da melancia quanto da abóbora. Em sua infinita suavidade, o chuchu compõe sopas e suflês, faz par com camarão, se transforma em cereja ou chuchurejas.
Claro, dizem as más línguas que é sem graça, insosso, desnecessário. Balela.Muito nutritivo e cheio de vitaminas, é cultivado no México desde a época dos Astecas - que o chamavam Chayotl - e se espalhou primeiro pelas Antilhas, Ilha da Madeira e depois por pela América Latina, sendo amplamente consumido.
Rico em água e fibras e pobre em calorias, é um queridinho das nutricionistas, é baratinho e abundante nas feiras e hortifruti e tem a vantagem de, assim como o milho, oferecer os primeiros frutos depois de 100 dias do plantio, o que permite umas três colheitas por ano, veja que abundância.
Por outro lado, o chuchu, embora de sabor pouco pronunciado, tem lá as suas idiossincrasias. Sensível, pode se machucar facilmente no transporte, e sua casca, que varia em tons de verde claro ao escuro, conta com pequenas farpas protetoras. Quem já descascou um chuchu sabe: cheio dos caprichos, libera uma gosma esbranquiçada que, depois de grudar na mão, custa a sair.
Mas, apesar de tantos predicados, o motivo pelo qual se costuma apelidar os afetos de chuchuzinho teria mais a ver com…o repolho.
Sim, o repolho.
É que, na França, ao invés da cegonha, uma história folclórica dá conta de que, para chegarem a esse mundo, os meninos surgem de dentro de repolhos e as meninas surgem de dentro de rosas.
E a palavra para repolho na língua francesa é chou, que também passa a ideia de algo redondo como a cabeça de um bebê ou docinhos neste formato.
O caso é que na linguagem popular dos afetos naquele país que pode ser tão blasé, usa-se dobrado, portanto chou-chou, próximo demais em som do nosso chuchu. Essa proximidade sonora é o que sugere que o apelido brasileiro para o ser amado derivou-se do francês, ainda que sejam vegetais diferentes.
Bom, o amor, para além de ter as tão faladas cinco linguagens, é, também, linguagem. E o jeito como chamamos aqueles a quem entregamos nosso coração importa. Inclusive, fruta do meu coração ou Buah hatiku é a expressão da língua indonésia reservada para chamar as pessoas queridas. Eu acho a coisa mais bonita, porque, veja bem, associo com o cajuzinho, esse fruto cujo nome científico, Anacardium, também invoca um coração.
E, nesse quesito, eu considero a língua portuguesa e todo seu arsenal de nomes de comida a coisinha mais amorosa. Chuchuzinho, cajuzinho, docinho, beijinho de coco. O amor, parece, é doce, mas pode ser também ácido e cítrico. Amargo, até: cacauzinho, já pensou? Ou, até, nos casos de amor goiano, quem sabe o ser amado pode ser assim, um pequizinho.
O amor, seja como for, é o amor, já bem escreveu Carluxo, o taciturno poeta mineiro que, depois que bateu as botas, descobriu-se um legado de poemas eróticos, quem diria.
Quanto ao irmão de minha amiga, parece que depois da bronca da mãe, não mais usa o apelido de chuchuzinho, tendo doravante se referido à namorada como cremosinha.
Adorei as descobertas que seu texto proporcionou.
aqui em casa virou uma piada interna e seguida de apelinho carinhoso. eu não gostava de chuchu (o apelido, o legume eu amo), mas meu marido tinha esse hábito: chamava todo mundo (inclusive eu) de chuchu. estão viramos "txutxu". aí sim, pode, o amor permite.