Sejam todas muito bem-vindas ao Conchas, esse restaurante imaginário, literário e jamais apartidário. Na bancada da vida, eu estou sempre com as mulheres. Sempre.
Há quase um século, foi dona Virginia Loba (Woolf) que diagnosticou que, para escrever e viver, uma mulher precisa de um teto todo seu. Esse teto, tanto literal quanto metafórico, cobre naturalmente uma cozinha.
Ora, você deve concordar, nunca faltaram mulheres na cozinha: pelo menos não nos afazeres domésticos, aquele faz e limpa e seca e guarda, dia após dia. Não faltam mulheres nas copas das empresas, no balcão das padarias e mercadinhos. Não faltam mulheres ofertando alento em forma de café, leite e bolo nas primeiras horas do dia, ao lado de paradas de ônibus e estações de metrô, em caixas térmicas que fazem as vezes de bancada.
E, no entanto, eu sinto falta delas. Das donas e proprietárias de si mesmas. Das representantes legislativas nas duas cúpulas da minha cidade do interior que calhou de ser capital do país.
Sinto falta de quem cozinha, mas pode não cozinhar se for o caso.
Sinto falta daquela que pariu e da que decidiu não parir. Da mulher que pode existir sem precisar se justificar em tudo; a que pode comer sem culpa, aquela que escolhe.
Eu não tenho dúvidas de que, hoje, apenas por existir, dirigir meu carro e tomar meu pileque e cantar e dançar, eu vivo o sonho de todas as minhas antepassadas. Usufruo da luta e da labuta de todas elas, eu sorvo de um caldo que ferve desde muito antes de eu nascer e me comprometo a manter esse fogo acesso.
Mas ainda é insuficiente.
Porque não basta ocupar a cozinha, ainda que ela seja toda sua. É preciso assegurar às mulheres um lugar à mesa. Dos adultos. É urgente sentar na ponta, pagar a conta e pedir por mais.
Eu quero ver mulheres nas mesas redondas das Nações Unidas, negociando a paz. Anseio vê-las nas mesas dos laboratórios, trazendo as soluções para o impensável. Quero encontrá-las com tempo livre nas mesas dos parques, e também nas mesas das audiências públicas liderando a discussão.
Quero ver cada vez mais mulheres. Sentadas, descansadas, servidas e satisfeitas. Viajando sozinhas e sem medo, liderando brigadas, conduzindo pela gentileza competente, levando crédito pelas próprias receitas, falando sem interrupções, florescendo sem cortes. Podendo sorrir sem retaliações. Nenhuma a menos.
Longe dos princípios de princesas, eu quero ver mulheres nos palácios : da Justiça, do Itamaraty, do Buriti, da Alvorada e do Planalto. Quero viver ( e vou!) para acompanhar uma mulher, de novo, começar - e terminar - o seu mandato na mesa máxima do meu país. E, no meio tempo, oferecendo receita de macarrão à carbonara, porque não se governa com fome.
Ainda bem que esse texto foi escrito por uma mulher. Brilhante.
Vivas, visíveis e livres 🔥 que assim seja, minha Grace