Sejam bem vindos ao Conchas, este espaço de encontro, esse restaurante sem louça para lavar.
Antes de conjurar um restaurante imaginário, eu com frequência pensava em pratos, e depois em menus com entrada e sobremesa, depois em mesas longas, com louças brancas e florzinhas azuis e amarelas.
E, uma vez obstinada no imaginar, seguia detalhando mentalmente os outros elementos indispensáveis para um verdadeiro desfrute dos sentidos: guardanapos de linho cru, velas de cera de abelha, arranjos de alecrim e lavanda, aqueles cordões com luzinhas amarelas por cima.
Sob nossas cabeças, um céu estrelado, um barulho de rio correndo lá longe, e uma banda, sim, músicos executando toda sorte de arranjos, possivelmente num improviso astuto. Jazz.
E, para completar, não posso deixar apenas os pratos, mas suas autorias. Hoje, compartilho uma versão de um texto de 2017, uma franca homenagem a algumas das pessoas que admiro muito nesta arte de cozinhar, falar e pensar sobre o que se come, sobre quem se é.
Na época, Carlos Alberto Dória, que foi meu professor, dividiu a história com sua amiga dele, também citada, e foi uma única palavra nos comentários que me trouxe uma alegria para sempre.
Quando as bordas dos cogumelos começam a esturricar e vem aquela tentação de abaixar o fogo, resisto. Deixo persistirem os marrons quase até o preto, me inclino até a grelha para cafungar o aroma pungente. Paola sussurra na minha cabeça “ isso, pode deixar queimar, esse gosto esta correcto, sim”.
Na boca ao lado, começa a engrossar um caldo de mandioca jovem, honesta, comprada na feira, cozida aos poucos. É o Dória que me alcança o sal, mas com olhar de censura; os índios não careciam de sal coisíssima nenhuma bem lá no começo desse brazilzão de meu deus.
Penso em trocar o tempero por uma pitada de lemon pepper, mas o professor se contorce de aflição e deixo pra lá, melhor não gourmetizar nada, chega. Acato.
Para a salada, espio meu projeto de horta, a gaveta de baixo e vou catando de tudo um pouco até chegar nas cenouras com folha e tudo, na couve ainda nos talos.Neide, prática, passa a mão nas folhagens e me assegura; come-se! Se ela diz eu acredito e repito, e fica bom, e todo mundo gosta.
Na hora de colocar a mesa, pratos de estampas diferentes e cores harmoniosas; tudo meio garimpado, peças que fui ganhando achando e reciclando, uma toalha bonita. Rita aprova mas dá a dica: descomplica! E autoriza uma caipirinha pra abrir o apetite, afinal é fim de semana.
Todos eles se sentam, comida pronta, copos cheios, e chega ela, meio esbaforida, vai entrando sem cerimônia e contando um causo incrível sobre vendedores de frutas no mercado de Pinheiros, ou sobre a última modinha no restaurante bacanudo nos Jardins ou sobre os peixes mais frescos que existem no litoral de Paraty.
Ah, Nina, todo mundo aqui vive mais porque você espalhou suas histórias. E todo mundo come e ri e brinda até a luz apagar e a louça ficar limpa. Dos infinitos banquetes imaginários, esse vai ficar na memória.
Cate por aí 🐚
Quando a revista Gourmet, uma das maiores publicações dedicadas à gastronomia do mundo, chegou aos 60 anos de existência , sua então editora,
, selecionou os melhores textos de todos os tempos para o livro Banquetes intermináveis.
É uma verdadeira viagem deliciosa ao redor do mundo, com crônicas de autores como M.FK Fisher, Laurie Colwin, Ruth Harkness, James Beard, Elizabeth David.Para a edição brasileira , Nina Horta, que assina o prefácio, também se encarregou da tradução, ao lado de Luiz Horta e Mário Valela. Vale muito a pena ler e se deliciar.
Todo mês de março é delicado e potencialmente problemático. Mas, escolho destacar uma série de postagens do perfil da Crudo, empresa de consultoria e branding que listou mulheres brasileiras que fazem no setor de hospitalidade, alimentos e bebidas, gente muito bacana de acompanhar e prestigiar.